segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Rivalidade entre o Americano e o Goytacaz veio antes mesmo do 1° jogo

Goytacaz, na época, com dois anos, e o Americano vivendo seus primeiros dias
 Reprodução
Faltam 39 dias para a realização do maior clássico do futebol do interior do Rio de Janeiro, o Goyta-Cano, que é o confronto que envolve o Goytacaz Futebol Clube e o Americano Futebol Clube, ambas equipes de Campos, que não ocorre há quase 10 anos e terá seu retorno no dia 2 de março, na estreia de ambas as equipes na Série B de 2013, às 15 horas no estádio Ari de Oliveira e Souza, o Arizão.
Poucos, muito poucos mesmo, fora de Campos, são capazes de imaginar até onde possa chegar o grau de rivalidade existente entre o Americano e o Goytacaz. Ela vem de longe e há quem diga que surgiu antes mesmo do primeiro jogo entre os dois clubes, em 1914. 
O Goytacaz, na época, com dois anos, e o Americano vivendo seus primeiros dias, já se apresentavam aos olhos dos campistas como as duas forças irresistíveis do futebol local, embora o Internacional, o Campos e o Rio Branco fizessem por merecer as atenções gerais numa fase em que o futebol não contava com o grande número de adeptos de agora.
Muitos anos depois, em 1975, com a inclusão do Americano no Campeonato Brasileiro, a gente alvi-anil se comprometeu, como um juramento que é feito à beira do túmulo, a não ver um jogo sequer dos sete que o rival faria no ampliado Estádio Godofredo Cruz, pelo certame promovido pela Confederação Brasileira de Desportos. Estranhamente, no entanto, o médico Nílson Cardoso de Souza, com raízes profundas de amor ao Goytacaz, veio da praia de Grussaí e entrou no Estádio Godofredo Cruz com uma placa: "Rivais em Campos, unidos no Nacional".
- Isto não quer dizer que mudei. Significa, apenas, que torço pela minha cidade. Agora, jamais beberei da glória que o Americano possa alcançar - comentou, na oportunidade, o conhecido médico.
Alguns anos antes, na Praça Nilo Peçanha, em Barra do Piraí, onde o Goytacaz teria que jogar contra o Central pelo Campeonato Fluminense, Salvador Araújo Nunes, ao saber da rivalidade existente entre o mesmo Central e o Royal, clubes daquela cidade, deu uma explicação que considerou lógica para provar o seu desamor ao Americano:
- No Rio, deixei de ser Botafogo só porque a sua camisa é igual à do Americano.
José Gabriel ainda tomava cafezinho, no Galeria, com Francisco das Chagas Siqueira, José Paes, Rômulo Barros e muitas outras figuras ligadas ao Americano. "Mas é - como dizia - para saber o que eles estão armando contra o Goytacaz". O médico Jacinto Simões, um dos grandes presidentes do Goytacaz e ex-jogador do São Cristóvão e do Vasco da Gama, no tempo em que estudava no Rio de Janeiro, não só não foi a qualquer jogo do Americano, no Campeonato Brasileiro de 1975, como também não parava na rua para "não perder tempo com esses merdas".

O certo é que Goytacaz e Americano nunca se deram bem e, quando partiu de Nílson Cardoso de Souza a idéia de levar aquela placa para o Estádio Godofredo Cruz, muita gente na Rua do Gás criticou o filho de Ari de Oliveira e Souza: "O Nílson parece que tem porcaria na cabeça!".
A guerra entre os dois grandes clubes foi, sempre, franca e aberta, muitas vezes atingindo as raias de brigas homéricas entre jogadores e torcedores dos dois clubes.
A Folha do Comércio, em fevereiro de 1923, publicava na primeira página matéria sobre o fracasso do jogo Americano x Goytacaz, que é transcrita, inclusive com a grafia da época:
"Conforme noticiamos ontem em primeira mão, o Goytacaz não aceitou o convite que lhe dirigira o Americano para a realização de uma partida de foot-ball no próximo dia 18.

Como não podia deixar de ser, a nova causou pasmo em nosso meio sportivo, notadamente nas rodas do Americano, onde se tinha como fora de duvida a aceitação do Goytacaz.
A notícia causou mais surpresa à vista dos precedentes, pois era notoria que a turma goytacaz não escondia a vontade de fazer a equipe do Americano conhecer o peso da homogenea esquadra alvi-anil.
Ademais, os paredros da valente sociedade sportiva da Rua do Gaz, quando abordados, sempre deram a entender que era coisa fora de duvida a aceitação do convite.
Poucos dias ha que um prestigioso diretor do Goytacaz aventou a um influente alvinegro, mais ou menos o seguinte: Fulano. Você que tem influencia no Americano, vê se arranja o seu club convidar o Goytacaz para um jogo, proximamente. O meu grêmio não faz o convite para não parecer covardia, pois o nosso quadro está muito forte e o de voces um pouco desfalcado, e depois julgar-se-ha por aqui que quizemos aproveitar a ocasião.
O sportman alv-inegro discordou da superioridade do alvi-celeste e disse que o seu club - o Americano -, desconhecia toda essa força da esquadra alvi-anil, que não fazia medo e que iria ajeitar as cousas para a promoção do jogo.
Dias depois, o alvi-negro, em sessão de sua directoria, resolvia convidar o Goytacaz para um encontro de foot-ball; e, depois de algumas delongas. este club resolve rejeitar o convite do Americano.
Não nos é dado comentar as causas determinantes da rejeição do Goytacaz, e nos limitamos, somente, a exarar aqui o que colhemos de fonte que julgamos fidedigna".
Ainda na Folha do Comércio, era transcrito o ofício do Goytacaz ao Americano, nos seguintes termos:
"Respondendo ao vosso officio de 1º do corrente, cabe-me informar a vv.ss. que, em sessão de ontem, resolveu a nossa directoria, por unanimidade, não aceitar o honroso convite para o jogo amistoso que se realizaria no dia 18, de accordo com os desejos manifestados entre as esquadras deste club e as do clube de vv.ss.
A nossa recusa é motivada, apenas, pela vontade que temos de evitar a reprodução de certos factos lamentáveis que se tem observado no decorrer desses encontros, ocorrências estas que tem repercutido tristemente no nosso meio esportivo.
Devido a esses acontecimentos, temos chegado á conclusão de que os jogos entre os dois clubes deverão ser, tão somente, os que obedecerem aos campeonatos oficiais ou á disputa de troféus instituídos.
Não escondemos a magóa que essa deliberação obrigada nos causa, justamente agora, quando se acredita que a nossa principal equipe está em optimas condições de fórma, e ainda porque sempre demonstramos a maior satisfação em enfrentar as pujantes esquadras do club de vv.ss.
Não terminamos este sem pedir a vv.ss. licença para um leve reparo nos dizeres de vosso offício. É que, a nosso ver, a decadencia allegada por vv.ss. e por que atravessa o foot-ball campista, não tem como causa factora e preponderante a falta de jogos entre esses dois clubs, cujos jogos, de forma alguma resolverão esse caso de visível desanimo.
Entendemos que essa real decadencia é originada das consequencias más e desastrosas de factos recentes, cuja responsabilidade cabe á nossa política geral sportiva, contra a qual precisamos, todos nós, offerecer serio combate.
Esses encontros terminam após a luta. O enthusiasmo desses momentos, passa. Mas a decadencia caracterizada ficará, continuará insoluvel, se de nossa ação conjuncta não surgirem melhores desejos para a moralização do sport, competíveis com uma política de equidade, justiça, e de respeito ás leis que regem as cousas sportivas locaes.
Eis como encaramos a causa desse phenomeno gravíssimo que é a decadencia por que atravessa o foot-ball campista.
Com os protestos de nossa consideração, apresento-lhes os nossos cumprimentos.
O secretario, (a) Sílio Oliveira Reis.
Campos, 8 de fevereiro de 1.923".
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Com dados do livro "Histórias do Futebol Campista", de Paulo A Ourives.

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