sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Cultura em movimento contra manifestação de racismo por alunos do IFF

PAULA VIGNERON 



Manifestação no IFF

Com cartazes, instrumentos musicais e danças africanas, alunos e professores do campus Centro do Instituto Federal Fluminense (IFF) e de diversos campi de institutos federais do Maranhão usaram de uma manifestação da cultura afro-brasileira para se reunirem em um ato contra o racismo na manhã desta quinta-feira (9), na instituição de ensino campista. O ato aconteceu após estudantes maranhenses terem sido vítimas de preconceito racial durante a realização do III Encontro Nacional de Núcleos de Estudos Afrobrasileiros e Indígenas e grupos correlatos da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológicas, que acontece em Campos. O ato acontece após a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) conceder ordem de habeas corpus favorável ao professor do IFF Maurício Nunes Lamônica, que responde ação penal por de ato de racismo.

A comitiva do Maranhão chegou à sede do IFF Centro na última segunda-feira (6) para apresentação de trabalhos no evento. A impressão inicial do grupo foi de encantamento com a estrutura do instituto. Mas, no dia seguinte, começaram os problemas. No ônibus em que chegaram os maranhenses, foram riscadas provocações aos estudantes e professores do Nordeste. "Aqui tem água" e "#melava" foram algumas das frases escritas no veículo.
Desde então, os atos ficaram mais graves. Nessa quarta-feira (8), no campus Guarus do IFF, os alunos foram chamados de macumbeiros após a apresentação de um trabalho. Também na quarta, estudantes do campus Centro fizeram gestos simulando o comportamento dos macacos, para ridicularizar os colegas nordestinos. E, à noite, o grupo foi informado de que não havia mais comida disponível para eles.
— Falaram que não tinham mais o alimento. E, quando um foi um pouco mais tarde, o alimento foi encontrado. Isso foi o que mais nos revoltou. Nós fizemos uma discussão ali, mostramos que estávamos indignados porque não dava mais para ficar calado. Uma coisa é você cometer uma vez e se conscientizar, outra coisa é você continuar com aquele ato. Estamos aqui como profissionais. Somos estudantes, pesquisadores. O que queríamos era ser bem recebidos, mas não foi o que aconteceu — relatou o maranhense Fabrício Joseph Dias Costa, de 15 anos.



Ato contra racismo no IFF


De acordo com o adolescente, que cursa o ensino médio, o grupo veio para Campos com o objetivo de apresentar um projeto que visa "quebrar todos os estereótipos lançados pela sociedade":
— E, quando chegamos, fomos alvo de xenofobia, que é um mal terrível. Mas não parou por aí. Fomos vítimas de racismo, preconceito, homofobia. O que nós queríamos? Queríamos trazer a proposta de dizer a todos os estados em que estamos passando para deixarem de praticar esses atos. Jovens ficaram tristes ao receberem essas críticas. Nós passamos mais de três meses elaborando o projeto, para sermos recebidos dessa forma. Já nos manifestamos, como ato de revolta. Sabemos os nossos direitos. Viemos para cá para tentar valorizar nossa sociedade e somos alvo de algo que não tem explicação, de algo que é desprezível. Nós somos negros, mas não temos vergonha de quem somos. Reconhecemos nosso valor. Vários jovens queriam ir embora antes de terminar o projeto porque se sentiram humilhados – acrescentou o estudante.
As atitudes dos estudantes do campus Centro, no entanto, não representam todo o corpo discente da unidade de ensino. Atriz, professora e aluna do curso de licenciatura em Teatro, Adriana Medeiros disse estar envergonhada e pediu, aos maranhenses, desculpas em nome do município:
Manifestação no IFF / Antônio Leudo

Às vezes, a gente acha que essa história ficou lá atrás. E o que estamos vendo, na verdade, é um retrocesso muito grande. Quando eu cheguei ao IFF, ontem, não sabia. Eu fui ver o que tinha acontecido e presenciei algumas coisas. Eles estavam muito comovidos e destruídos psicologicamente. Os maranhenses são brilhantes. São pessoas esclarecidas politicamente. A humilhação que essas crianças passaram no campus, humilhação causada por outros alunos, eu, sinceramente, não consigo entender. Minha sensação é de que fui humilhada também, porque sou negra, mulher, artista e candomblecista. Ser chamado de macumbeiro é simplesmente o outro não ter a menor noção do que está falando. Macumba é um instrumento. Nós somos candomblecistas ou umbandistas. Essa é nossa fé. Tocam no nosso sagrado como se fosse uma coisa abominável. Estou cansada. Estou com eles no ato de resistência, tentando entender o tamanho da boçalidade dessa elite medíocre, que, se fosse elite de fato, não teria esse tipo de arrogância.
Após o ocorrido, o IFF divulgou nota repudiando os atos discriminatórios praticados contra estudantes e educadores do Instituto Federal do Maranhão.
"Tais atitudes não representam a comunidade de estudantes e servidores do IFFluminense. Não admitimos o desrespeito e a não-valorização da riqueza da diversidade dentro da instituição, e atitudes como as ocorridas maculam a reputação e a história de uma terra sofrida como Campos dos Goytacazes, marcada pela escravidão, pela pobreza, pela injustiça, mas também marcada por histórias de lutas e de brava gente.
Somos expressamente contra qualquer ato de violência. E reafirmamos que o IFFluminense é um espaço de transformação de vidas, uma instituição de oportunidades e onde todos são bem-vindos. O que aconteceu se coloca como um grande desafio para todos nós, de levar consciência e educação para nossos estudantes e servidores, mostrando que temos muito a caminhar enquanto sociedade".

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