O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, deu presentão completo para os réus da Caixa d'água. Depois de revogar, ontem, a prisão do ex-governador Garotinho, hoje ele retirou as medidas cautelares impostas pelo TRE à ex-governadora Rosinha. Ela estava com tornozeleira eletrônica e cumprindo recolhimento domiciliar à noite e aos finais de semana, além de estar proibida de ter contato com os demais réus, à exceção do marido.
A decisão foi no segundo dia do recesso forense, no qual passou a atuar como plantonista. No primeiro dia, ele libertou Garotinho. (Lembre aqui)
Confira a decisão de Gilmar Mendes:
"DECISÃO
1. Trata-se de recurso em habeas corpus, com pedido de medida liminar, interposto do acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro exarado nos autos do HC nº 0600181-22, que revogou a prisão preventiva da ora paciente e aplicou medidas cautelares nos autos da Ação Penal nº 12-81/RJ.
Nas razões deste pedido de medida liminar, o recorrente narra:
a) “está fundamentado em duas premissas largamente explicitadas no bojo do Recurso Ordinário, quais sejam: (i) a inexistência de pressupostos autorizadores da prisão preventiva, logo, consequente ausência dos requisitos que dariam ensejo à sua substituição pelas medidas alternativas do artigo 319 do CPP; e (ii) a específica desnecessidade de monitoramento eletrônico da Recorrente, expondo-a à ridicularização pública de sua imagem” (fl. 1);
b) os tribunais superiores, incluído, aqui, o Supremo Tribunal Federal, têm por função tecer orientações jurisprudenciais que devem pautar a atuação dos demais órgãos do Poder Judiciário do país;
c) no julgamento da ADPF 444, a Suprema Corte suspendeu a “torpe utilização do instrumento da condução coercitiva em fase inquisitorial, consagrando os preceitos insculpidos na Constituição da República” (fl. 2). Nessa linha de raciocínio, toda e qualquer medida cautelar dissociada dos princípios da proporcionalidade e da legalidade deve ser afastada;
d) “a aplicação desnecessária deste tipo de medida cautelar [monitoramento eletrônico] causa uma grave ofensa à imagem, personalidade e dignidade do ser humano, na medida em que o expõe ao Coliseu midiático, tornando-o controlável e monitorado como se fosse um objeto” (fl. 2);
e) por se tratar de prisão ilegal, sua substituição por medida alternativa, por decorrência lógica, também seria medida ilegal.
Requer, por fim, “a urgente apreciação do pedido liminar do Recurso Ordinário, para: (i) determinar a revogação das medidas cautelares impostas à Recorrente, tendo em vista a reconhecida inexistência de pressupostos autorizadores da prisão preventiva, não cabendo, portanto, sua substituição por medidas cautelares do artigo 319 do CPP; ou (ii) alternativamente, a determinação de retirada da tornozeleira eletrônica desnecessariamente imposta, com adequação das medidas alternativas conforme aquelas anteriormente aplicadas por este Tribunal Superior Eleitoral no precedente estabelecido no julgamento do Habeas Corpus nº 0602487-26.2016.6.00.0000, impetrado em favor do paciente Anthony William Garotinho Matheus de Oliveira, e julgado pelo Plenário no dia 24 de novembro de 2016” (fls. 2-3 – grifos no original).
Decido.
2. Neste juízo provisório, verifico que o tema de fundo desta impetração relaciona-se com os mesmos substratos fáticos do RHC nº 0600186-44, do RHC nº 0600182-07 e do HC nº 0604359-42 (suposta doação de recursos via caixa dois nas Eleições de 2014), já apreciados por mim em 20.12.2017 – art. 350 do Código Eleitoral, organização criminosa, corrupção passiva, extorsão e lavagem de dinheiro.
Contudo, em relação à ora paciente, o próprio Regional revogou a prisão preventiva, nos seguintes termos:
Considerando os fatos acima expostos, consolidados em decisão judicial que goza de presunção de legalidade, patente a gravidade dos fatos narrados com potencial para macular o regular deslinde da instrução probatória.
Por outro lado, há de se reconhecer quanto ao da paciente, que a periculum libertartis decisão não logrou demonstrar conduta concreta da ré que indicasse provável reiteração delituosa, bem como fato potencialmente nocivo ao regular desenvolvimento da instrução probatória.
Como delineado acima, há evidências concretas de condutas ofensivas às investigações perpetradas por outros membros da organização, mas não há o liame entre tais condutas e alguma ação efetiva da ré.
Neste ponto, cumpre assentar que o periculum libertatis é critério personalíssimo que só pode ser verificado em face das ações de cada indivíduo.
Fundamental, ainda, repisar que a prisão preventiva é medida extrema, de ultima ratio, que somente se justifica quando ineficazes as demais medidas cautelares, conforme a redação do § 6º do art. 282:
§ 6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).
Nesse cenário, em deferência ao princípio da proporcionalidade, considero que as medidas cautelares dispostas nos incisos III, IV, V e IX do art. 319 são suficientes e adequadas para resguardar a garantia da ordem pública, com vistas a inibir possível reiteração delitiva, bem como para assegurar a instrução criminal.
(...)
Isto posto, CONCEDO PARCIALMENTE A ORDEM para determinar:
A) conforme o inciso III do art. 319 do Código de Processo Penal, proibir a paciente de manter contato com quaisquer dos demais réus da Ação Penal 12-81;
Senhora Presidente, quanto à proibição da paciente de manter contato com quaisquer dos demais réus da Ação Penal 12-81, gostaria de aditar meu voto, permitindo o contato da paciente com o réu Anthony Garotinho, por ser o seu marido.
Gostaria que tal aditamento constasse do meu voto.
(...)
B) nos termos do inciso IV do art. 319 do Código de Processo Penal, proibir a paciente de ausentar-se da Comarca sem autorização do Juízo Eleitoral da 98ª Zona Eleitoral;
C) com fundamento no inciso V do art. 319 do CPP, impor à paciente o recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga, caso a investigada ou acusada tenha residência e trabalho fixos, e
D) por fim, determinar que a ré seja submetida a monitoração eletrônica, conforme disposto no inciso IX do art. 319 do CPP. (Grifos nossos)
Observo que o próprio Regional assentou que o decreto de prisão preventiva não indicou nenhum ato concreto e atual praticado pela paciente com o intuito de fragilizar a instrução criminal. Como se sabe, a prisão preventiva, enquanto mitigação da regra da presunção de inocência, exige fundamentação idônea, respaldada em motivos cautelares concretamente verificados e contemporâneos ao ato, demonstrando a inevitável necessidade de ser utilizada em detrimento de outras medidas cautelares diversas da prisão.
Conforme nos ensina o Ministro Celso de Mello, “a motivação há de ser própria, inerente e contemporânea à decisão que decreta (ou que mantém) o ato excepcional de privação cautelar da liberdade, pois a ausência ou a deficiência de fundamentação não podem ser supridas ‘a posteriori’” (HC 98821/CE, Segunda Turma, julgado em 9.3.2010 – grifos nossos).
No tocante às medidas cautelares aplicadas à paciente, o art. 282, § 6º, do CPP estabelece que “a prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319)”. O inciso I do referido dispositivo define a adoção das medidas para garantir a aplicação da Lei Penal, a investigação ou a instrução criminal e evitar a prática de infrações penais, adequadas à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado (inciso II). É dizer: somente cabe a adoção das medidas cautelares quando presentes os requisitos da segregação cautelar, competindo ao magistrado verificar a adequação e a necessidade (proporcionalidade em sentido estrito) em substituir a prisão pelas previstas no art. 319 do CPP.
Dessa forma, neste juízo provisório, como não há nenhum ato concreto atual que indique, minimamente, violação aos requisitos do art. 282, inciso I, do CPP, entendo que as medidas cautelares revelam-se desproporcionais neste momento.
3. Ante o exposto, defiro o pedido de liminar para suspender as medidas cautelares impostas pelo acórdão regional nos autos do HC nº 0600181-22/RJ.
Comunique-se e cumpra-se, com urgência.
Publique-se.
Brasília, 22 de dezembro de 2017".
A decisão foi no segundo dia do recesso forense, no qual passou a atuar como plantonista. No primeiro dia, ele libertou Garotinho. (Lembre aqui)
Confira a decisão de Gilmar Mendes:
"DECISÃO
1. Trata-se de recurso em habeas corpus, com pedido de medida liminar, interposto do acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro exarado nos autos do HC nº 0600181-22, que revogou a prisão preventiva da ora paciente e aplicou medidas cautelares nos autos da Ação Penal nº 12-81/RJ.
Nas razões deste pedido de medida liminar, o recorrente narra:
a) “está fundamentado em duas premissas largamente explicitadas no bojo do Recurso Ordinário, quais sejam: (i) a inexistência de pressupostos autorizadores da prisão preventiva, logo, consequente ausência dos requisitos que dariam ensejo à sua substituição pelas medidas alternativas do artigo 319 do CPP; e (ii) a específica desnecessidade de monitoramento eletrônico da Recorrente, expondo-a à ridicularização pública de sua imagem” (fl. 1);
b) os tribunais superiores, incluído, aqui, o Supremo Tribunal Federal, têm por função tecer orientações jurisprudenciais que devem pautar a atuação dos demais órgãos do Poder Judiciário do país;
c) no julgamento da ADPF 444, a Suprema Corte suspendeu a “torpe utilização do instrumento da condução coercitiva em fase inquisitorial, consagrando os preceitos insculpidos na Constituição da República” (fl. 2). Nessa linha de raciocínio, toda e qualquer medida cautelar dissociada dos princípios da proporcionalidade e da legalidade deve ser afastada;
d) “a aplicação desnecessária deste tipo de medida cautelar [monitoramento eletrônico] causa uma grave ofensa à imagem, personalidade e dignidade do ser humano, na medida em que o expõe ao Coliseu midiático, tornando-o controlável e monitorado como se fosse um objeto” (fl. 2);
e) por se tratar de prisão ilegal, sua substituição por medida alternativa, por decorrência lógica, também seria medida ilegal.
Requer, por fim, “a urgente apreciação do pedido liminar do Recurso Ordinário, para: (i) determinar a revogação das medidas cautelares impostas à Recorrente, tendo em vista a reconhecida inexistência de pressupostos autorizadores da prisão preventiva, não cabendo, portanto, sua substituição por medidas cautelares do artigo 319 do CPP; ou (ii) alternativamente, a determinação de retirada da tornozeleira eletrônica desnecessariamente imposta, com adequação das medidas alternativas conforme aquelas anteriormente aplicadas por este Tribunal Superior Eleitoral no precedente estabelecido no julgamento do Habeas Corpus nº 0602487-26.2016.6.00.0000, impetrado em favor do paciente Anthony William Garotinho Matheus de Oliveira, e julgado pelo Plenário no dia 24 de novembro de 2016” (fls. 2-3 – grifos no original).
Decido.
2. Neste juízo provisório, verifico que o tema de fundo desta impetração relaciona-se com os mesmos substratos fáticos do RHC nº 0600186-44, do RHC nº 0600182-07 e do HC nº 0604359-42 (suposta doação de recursos via caixa dois nas Eleições de 2014), já apreciados por mim em 20.12.2017 – art. 350 do Código Eleitoral, organização criminosa, corrupção passiva, extorsão e lavagem de dinheiro.
Contudo, em relação à ora paciente, o próprio Regional revogou a prisão preventiva, nos seguintes termos:
Considerando os fatos acima expostos, consolidados em decisão judicial que goza de presunção de legalidade, patente a gravidade dos fatos narrados com potencial para macular o regular deslinde da instrução probatória.
Por outro lado, há de se reconhecer quanto ao da paciente, que a periculum libertartis decisão não logrou demonstrar conduta concreta da ré que indicasse provável reiteração delituosa, bem como fato potencialmente nocivo ao regular desenvolvimento da instrução probatória.
Como delineado acima, há evidências concretas de condutas ofensivas às investigações perpetradas por outros membros da organização, mas não há o liame entre tais condutas e alguma ação efetiva da ré.
Neste ponto, cumpre assentar que o periculum libertatis é critério personalíssimo que só pode ser verificado em face das ações de cada indivíduo.
Fundamental, ainda, repisar que a prisão preventiva é medida extrema, de ultima ratio, que somente se justifica quando ineficazes as demais medidas cautelares, conforme a redação do § 6º do art. 282:
§ 6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).
Nesse cenário, em deferência ao princípio da proporcionalidade, considero que as medidas cautelares dispostas nos incisos III, IV, V e IX do art. 319 são suficientes e adequadas para resguardar a garantia da ordem pública, com vistas a inibir possível reiteração delitiva, bem como para assegurar a instrução criminal.
(...)
Isto posto, CONCEDO PARCIALMENTE A ORDEM para determinar:
A) conforme o inciso III do art. 319 do Código de Processo Penal, proibir a paciente de manter contato com quaisquer dos demais réus da Ação Penal 12-81;
Senhora Presidente, quanto à proibição da paciente de manter contato com quaisquer dos demais réus da Ação Penal 12-81, gostaria de aditar meu voto, permitindo o contato da paciente com o réu Anthony Garotinho, por ser o seu marido.
Gostaria que tal aditamento constasse do meu voto.
(...)
B) nos termos do inciso IV do art. 319 do Código de Processo Penal, proibir a paciente de ausentar-se da Comarca sem autorização do Juízo Eleitoral da 98ª Zona Eleitoral;
C) com fundamento no inciso V do art. 319 do CPP, impor à paciente o recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga, caso a investigada ou acusada tenha residência e trabalho fixos, e
D) por fim, determinar que a ré seja submetida a monitoração eletrônica, conforme disposto no inciso IX do art. 319 do CPP. (Grifos nossos)
Observo que o próprio Regional assentou que o decreto de prisão preventiva não indicou nenhum ato concreto e atual praticado pela paciente com o intuito de fragilizar a instrução criminal. Como se sabe, a prisão preventiva, enquanto mitigação da regra da presunção de inocência, exige fundamentação idônea, respaldada em motivos cautelares concretamente verificados e contemporâneos ao ato, demonstrando a inevitável necessidade de ser utilizada em detrimento de outras medidas cautelares diversas da prisão.
Conforme nos ensina o Ministro Celso de Mello, “a motivação há de ser própria, inerente e contemporânea à decisão que decreta (ou que mantém) o ato excepcional de privação cautelar da liberdade, pois a ausência ou a deficiência de fundamentação não podem ser supridas ‘a posteriori’” (HC 98821/CE, Segunda Turma, julgado em 9.3.2010 – grifos nossos).
No tocante às medidas cautelares aplicadas à paciente, o art. 282, § 6º, do CPP estabelece que “a prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319)”. O inciso I do referido dispositivo define a adoção das medidas para garantir a aplicação da Lei Penal, a investigação ou a instrução criminal e evitar a prática de infrações penais, adequadas à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado (inciso II). É dizer: somente cabe a adoção das medidas cautelares quando presentes os requisitos da segregação cautelar, competindo ao magistrado verificar a adequação e a necessidade (proporcionalidade em sentido estrito) em substituir a prisão pelas previstas no art. 319 do CPP.
Dessa forma, neste juízo provisório, como não há nenhum ato concreto atual que indique, minimamente, violação aos requisitos do art. 282, inciso I, do CPP, entendo que as medidas cautelares revelam-se desproporcionais neste momento.
3. Ante o exposto, defiro o pedido de liminar para suspender as medidas cautelares impostas pelo acórdão regional nos autos do HC nº 0600181-22/RJ.
Comunique-se e cumpra-se, com urgência.
Publique-se.
Brasília, 22 de dezembro de 2017".
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