Maior parte dos abusos contra idosos acontece nas casas e são praticados pela família
POR THIAGO GOMES
Muitos são os motivos que levam o idoso a sofrer maus tratos, mas nenhum deles é justificável. Poder público afirma que tem cumprido seu papel com rede de proteção.
A maior parte dos casos de violência contra os idosos acontece em casa e é praticado, principalmente, por filhos e netos. Não há estatísticas municipais, mas dados do governo federal apontam que, no ano passado, o número de denúncias envolvendo os vários tipos de violência contra idosos no Brasil aumentou 13% em relação a 2017. Diante dos casos frequentes dos vários tipos de abuso contra pessoas acima dos 60 anos, junho foi escolhido como o mês dedicado à proteção e segurança da terceira idade.
Depois de uma vida inteira dedicada à família, Lourdes (nome fictício pelo qual a equipe de reportagem identificará a personagem) foi perdendo espaço na vida do filho após a chegada da nora. Há cerca de um mês, ela, que tem 81 anos, chegou ao Asilo do Carmo e conta que pensou por várias vezes em tirar a própria vida por causa dos maus-tratos que partiam da esposa de seu filho, enquanto ele não estava em casa.
Fome e até alguns episódios de agressões físicas foram as inspirações de Lourdes para compor uma música triste, na qual ela se despedia da vida. A idosa justifica que a canção foi uma forma de desabafar, de suportar o sofrimento: “Vou me desistir do mundo, já não quero mais viver. A vida para mim já terminou todo o prazer. Eu vou dar a despedida e vou para juntinho a Deus. Que da vida estou cansada e viver já não quero mais”, diz parte dos versos compostos pela idosa que sensibilizaram a equipe que cuida dela no asilo.
Ainda segundo relatos de Lourdes, quando o filho saía para trabalhar, a nora não a alimentava e a trancava em casa. “O meu filho sempre foi muito bom para mim, mas ele trabalhava 24 horas direto. Quando estava fora, as agressões começavam. Às vezes ela almoçava e jantava trancada no quarto e me deixava com fome”, disse a idosa de voz doce, semblante calmo, porém, sofrido.
Hoje, feliz, Lourdes afirma que encontrou na equipe multidisciplinar do Asilo do Carmo e nos outros internos da instituição o apoio que não tinha em casa.
Além do filho, a idosa tem uma neta, a quem ela acusa de abandono. “Nem sabe onde eu estou. Foi viver a vida dela e me esqueceu”.
Várias faces da violência
Promotor Luiz Cláudio Carvalho de Almeida (Foto:Silvana Rust)
De acordo com o titular da Promotoria de Justiça de Proteção ao Idoso e à Pessoa com Deficiência do Núcleo Campos dos Goytacazes, Luiz Cláudio Carvalho de Almeida, violência física não é o tipo mais comum de abuso sofrido na terceira idade, mas outros agravos como abandono, negligência, violência financeira e psicológica vitimam com frequência quem já passou dos 60.
Por meio das denúncias que chegaram ao Ministério Público em 2017, foi possível traçar o perfil dos idosos vítimas no Estado do Rio de Janeiro. A maioria dos casos de violência envolveu mulheres. Foram 2.245 (68%) registros com vítimas do sexo feminino contra 1.035 (31%) do sexo masculino, além de outros 20 (1%) casos não identificados. Pessoas entre 60 e 79 anos estão entre os alvos mais frequentes, com 1.757 denúncias (56%), outros 1.184 casos com pessoas acima dos 80 anos (38%) e 192 com idade não identificada (6%).
Maioria dos abusos ocorre em casa
Ainda segundo dados do Ministério Público, o lar não é o local mais seguro para os idosos, já que a maioria das denúncias de maus tratos aconteceu na própria residência da vítima. Foram 2.736 denúncias. Hospital público veio em segundo lugar, com 109 registros. Já violências ocorridas na rua, veio em seguida, com 86; as Instituições de Longa Permanência para Idoso (ILPI) particulares tiveram 43 casos; hospitais particulares, com 43 registros; e ILPIs públicas, com cinco.
A Promotoria de Justiça de Proteção ao Idoso e à Pessoa com Deficiência apura denúncias de casos de violência que, normalmente, chegam pela Ouvidoria do Ministério Público, por meio do Disque 127, e também por meio do Disque 100, disponibilizado pelo Ministério da Justiça. “Infelizmente, o número de denúncia de violência contra o idoso cresceu muito e, atualmente, de todos os assuntos que chegam pela Ouvidoria, aqueles envolvendo idosos são maioria”, informou o promotor Luiz Cláudio Carvalho de Almeida.
Em casos de violência, o promotor disse que o órgão entra com ações para afastar o agressor do convívio do idoso. Também são comuns ações judiciais que visam cancelar procurações, curatela do idoso e até conseguir abrigo seguro para a vítima.
Abandono também é violência
Psicóloga Alice Almeida Lusitano
Maria (nome fictício), de 71 anos, disse que nem lembra mais da última vez em que teve contato com o filho, de 40 anos. Segundo a idosa, ele mora na Espanha há pelo menos duas décadas e há muito tempo não tem informações sobre a família que ele formou por lá.
Há pouco mais de um ano, Maria chegou ao Asilo do Carmo. Ela trabalhava como empregada doméstica, mas foi ficando debilitada, até não conseguir mais dar conta da rotina de uma casa. Antes de chegar ao asilo, já abandonada pelo filho, foi morar na casa de um casal de amigos. Os três envelheceram, ficaram doentes, e a filha do casal não teve condições de cuidar de todos e Maria foi levada para o Asilo do Carmo.
Apesar da alegria, a idosa não esconde a frustração de não ter mais contato com o único filho.
De acordo com a psicóloga da instituição, Alice Almeida Lusitano, ela tentou contato com o filho de Maria por uma rede social, mas não recebeu qualquer retorno.
Um asilo, várias histórias
O Asilo de Carmo, onde estão 57 internos, bem que tenta, mas é difícil substituir o papel da família na vida do idoso. Apesar das atividades elaboradas pela instituição e da assistência da equipe, o vínculo familiar é importante, conforme destaca a psicóloga Alice Almeida Lusitano.
Segundo a psicóloga, as histórias de maus tratos e abandono envolvendo idosos que chegam à instituição são variadas, mas todas com um final triste.
“Alguns idosos simplesmente são abandonados pela família. Em outros casos, foram os idosos que abandonaram a família ou praticaram maus tratos. E hoje os familiares têm dificuldade em estabelecer vínculo. Mas, seja qual for a história, o convívio com a família é muito importante”, disse a psicóloga.
Na rede pública
A Superintendência do Envelhecimento Saudável e Ativo (Sesa) da Prefeitura de Campos informou que conta com uma Rede de Proteção Social que envolve seis Casas de Convivência para atendimento aos idosos, visando o desenvolvimento cognitivo, físico, emocional e da prevenção com o foco da inovação e saúde do idoso. Além das Casas do Parque Tamandaré, Conselheiro Josino, Dores de Macabu e Travessão, tem ainda o Centro Dia do Idoso e a Colônia de Férias da Terceira Idade do Farol de São Thomé. As Casas de Convivência oferecem atividades físicas, dentro do projeto 60+ Saúde; aulas de dança e teatro, consultas e exames médicos.
“As boas práticas para o envelhecimento saudável da Sesa já apresentam resultados concretos”, afirmou a superintendente da pasta, Heloísa Landim.
Ainda segundo o órgão, no Centro Dia são oferecidas as seguintes especialidades médicas: cardiologista, geriatra, endocrinologista, ginecologista, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, nutricionista, angiologista, dermatologista, urologista, psicólogo e dentista. Em nota, o órgão informou que o atendimento ambulatorial acontece de segunda a sexta, das 7h às 17h e a marcação de consultas é de 14h às 17h, na sede da unidade, que fica na Travessa Santo Elias, 43, no Jardim Carioca, em Guarus.
“A terapeuta ocupacional também desenvolve a Oficina de Memória, realizada semanalmente. As atividades envolvem leitura de textos (jornais, revistas, livros e letras de músicas), jogos e dramatizações, a fim de estimular as diversas funções cerebrais, uma vez que, o índice de doenças relacionadas ao ostracismo na terceira idade tendem a aumentar. A Colônia de Férias do Farol funciona de segunda a sexta-feira com aulas de hidroginástica e ritmos para idosos. Além disso, o espaço oferece hospedagem para grupos da terceira idade. A reserva deve ser feita na Casa de Convivência do Parque Tamandaré”, concluiu a nota enviada pela Sesa.
Números no país
Em 2018, o número de denúncias de violência contra idosos no Brasil aumentou 13% em relação ao ano anterior. O Disque 100, um serviço federal, recebeu mais de 37 mil denúncias neste período. Destas, 38% foram relativas a negligência, 26% de violência psicológica (como xingamentos, humilhação), 20% relativas a abusos financeiros e patrimoniais (ficar com a aposentadoria ou destruir bens do idoso, por exemplo) e 12% das denúncias foram de violência física.
Mais de 14 mil vítimas eram idosos que tinham algum tipo de deficiência, seja física, mental, visual, ou auditiva. Ainda segundo dados do serviço, os principais agressores foram os próprios filhos ou netos.
POR THIAGO GOMES
Muitos são os motivos que levam o idoso a sofrer maus tratos, mas nenhum deles é justificável. Poder público afirma que tem cumprido seu papel com rede de proteção.
A maior parte dos casos de violência contra os idosos acontece em casa e é praticado, principalmente, por filhos e netos. Não há estatísticas municipais, mas dados do governo federal apontam que, no ano passado, o número de denúncias envolvendo os vários tipos de violência contra idosos no Brasil aumentou 13% em relação a 2017. Diante dos casos frequentes dos vários tipos de abuso contra pessoas acima dos 60 anos, junho foi escolhido como o mês dedicado à proteção e segurança da terceira idade.
Depois de uma vida inteira dedicada à família, Lourdes (nome fictício pelo qual a equipe de reportagem identificará a personagem) foi perdendo espaço na vida do filho após a chegada da nora. Há cerca de um mês, ela, que tem 81 anos, chegou ao Asilo do Carmo e conta que pensou por várias vezes em tirar a própria vida por causa dos maus-tratos que partiam da esposa de seu filho, enquanto ele não estava em casa.
Fome e até alguns episódios de agressões físicas foram as inspirações de Lourdes para compor uma música triste, na qual ela se despedia da vida. A idosa justifica que a canção foi uma forma de desabafar, de suportar o sofrimento: “Vou me desistir do mundo, já não quero mais viver. A vida para mim já terminou todo o prazer. Eu vou dar a despedida e vou para juntinho a Deus. Que da vida estou cansada e viver já não quero mais”, diz parte dos versos compostos pela idosa que sensibilizaram a equipe que cuida dela no asilo.
Ainda segundo relatos de Lourdes, quando o filho saía para trabalhar, a nora não a alimentava e a trancava em casa. “O meu filho sempre foi muito bom para mim, mas ele trabalhava 24 horas direto. Quando estava fora, as agressões começavam. Às vezes ela almoçava e jantava trancada no quarto e me deixava com fome”, disse a idosa de voz doce, semblante calmo, porém, sofrido.
Hoje, feliz, Lourdes afirma que encontrou na equipe multidisciplinar do Asilo do Carmo e nos outros internos da instituição o apoio que não tinha em casa.
Além do filho, a idosa tem uma neta, a quem ela acusa de abandono. “Nem sabe onde eu estou. Foi viver a vida dela e me esqueceu”.
Várias faces da violência
Promotor Luiz Cláudio Carvalho de Almeida (Foto:Silvana Rust)
De acordo com o titular da Promotoria de Justiça de Proteção ao Idoso e à Pessoa com Deficiência do Núcleo Campos dos Goytacazes, Luiz Cláudio Carvalho de Almeida, violência física não é o tipo mais comum de abuso sofrido na terceira idade, mas outros agravos como abandono, negligência, violência financeira e psicológica vitimam com frequência quem já passou dos 60.
Por meio das denúncias que chegaram ao Ministério Público em 2017, foi possível traçar o perfil dos idosos vítimas no Estado do Rio de Janeiro. A maioria dos casos de violência envolveu mulheres. Foram 2.245 (68%) registros com vítimas do sexo feminino contra 1.035 (31%) do sexo masculino, além de outros 20 (1%) casos não identificados. Pessoas entre 60 e 79 anos estão entre os alvos mais frequentes, com 1.757 denúncias (56%), outros 1.184 casos com pessoas acima dos 80 anos (38%) e 192 com idade não identificada (6%).
Maioria dos abusos ocorre em casa
Ainda segundo dados do Ministério Público, o lar não é o local mais seguro para os idosos, já que a maioria das denúncias de maus tratos aconteceu na própria residência da vítima. Foram 2.736 denúncias. Hospital público veio em segundo lugar, com 109 registros. Já violências ocorridas na rua, veio em seguida, com 86; as Instituições de Longa Permanência para Idoso (ILPI) particulares tiveram 43 casos; hospitais particulares, com 43 registros; e ILPIs públicas, com cinco.
A Promotoria de Justiça de Proteção ao Idoso e à Pessoa com Deficiência apura denúncias de casos de violência que, normalmente, chegam pela Ouvidoria do Ministério Público, por meio do Disque 127, e também por meio do Disque 100, disponibilizado pelo Ministério da Justiça. “Infelizmente, o número de denúncia de violência contra o idoso cresceu muito e, atualmente, de todos os assuntos que chegam pela Ouvidoria, aqueles envolvendo idosos são maioria”, informou o promotor Luiz Cláudio Carvalho de Almeida.
Em casos de violência, o promotor disse que o órgão entra com ações para afastar o agressor do convívio do idoso. Também são comuns ações judiciais que visam cancelar procurações, curatela do idoso e até conseguir abrigo seguro para a vítima.
Abandono também é violência
Psicóloga Alice Almeida Lusitano
Maria (nome fictício), de 71 anos, disse que nem lembra mais da última vez em que teve contato com o filho, de 40 anos. Segundo a idosa, ele mora na Espanha há pelo menos duas décadas e há muito tempo não tem informações sobre a família que ele formou por lá.
Há pouco mais de um ano, Maria chegou ao Asilo do Carmo. Ela trabalhava como empregada doméstica, mas foi ficando debilitada, até não conseguir mais dar conta da rotina de uma casa. Antes de chegar ao asilo, já abandonada pelo filho, foi morar na casa de um casal de amigos. Os três envelheceram, ficaram doentes, e a filha do casal não teve condições de cuidar de todos e Maria foi levada para o Asilo do Carmo.
Apesar da alegria, a idosa não esconde a frustração de não ter mais contato com o único filho.
De acordo com a psicóloga da instituição, Alice Almeida Lusitano, ela tentou contato com o filho de Maria por uma rede social, mas não recebeu qualquer retorno.
Um asilo, várias histórias
O Asilo de Carmo, onde estão 57 internos, bem que tenta, mas é difícil substituir o papel da família na vida do idoso. Apesar das atividades elaboradas pela instituição e da assistência da equipe, o vínculo familiar é importante, conforme destaca a psicóloga Alice Almeida Lusitano.
Segundo a psicóloga, as histórias de maus tratos e abandono envolvendo idosos que chegam à instituição são variadas, mas todas com um final triste.
“Alguns idosos simplesmente são abandonados pela família. Em outros casos, foram os idosos que abandonaram a família ou praticaram maus tratos. E hoje os familiares têm dificuldade em estabelecer vínculo. Mas, seja qual for a história, o convívio com a família é muito importante”, disse a psicóloga.
Na rede pública
A Superintendência do Envelhecimento Saudável e Ativo (Sesa) da Prefeitura de Campos informou que conta com uma Rede de Proteção Social que envolve seis Casas de Convivência para atendimento aos idosos, visando o desenvolvimento cognitivo, físico, emocional e da prevenção com o foco da inovação e saúde do idoso. Além das Casas do Parque Tamandaré, Conselheiro Josino, Dores de Macabu e Travessão, tem ainda o Centro Dia do Idoso e a Colônia de Férias da Terceira Idade do Farol de São Thomé. As Casas de Convivência oferecem atividades físicas, dentro do projeto 60+ Saúde; aulas de dança e teatro, consultas e exames médicos.
“As boas práticas para o envelhecimento saudável da Sesa já apresentam resultados concretos”, afirmou a superintendente da pasta, Heloísa Landim.
Ainda segundo o órgão, no Centro Dia são oferecidas as seguintes especialidades médicas: cardiologista, geriatra, endocrinologista, ginecologista, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, nutricionista, angiologista, dermatologista, urologista, psicólogo e dentista. Em nota, o órgão informou que o atendimento ambulatorial acontece de segunda a sexta, das 7h às 17h e a marcação de consultas é de 14h às 17h, na sede da unidade, que fica na Travessa Santo Elias, 43, no Jardim Carioca, em Guarus.
“A terapeuta ocupacional também desenvolve a Oficina de Memória, realizada semanalmente. As atividades envolvem leitura de textos (jornais, revistas, livros e letras de músicas), jogos e dramatizações, a fim de estimular as diversas funções cerebrais, uma vez que, o índice de doenças relacionadas ao ostracismo na terceira idade tendem a aumentar. A Colônia de Férias do Farol funciona de segunda a sexta-feira com aulas de hidroginástica e ritmos para idosos. Além disso, o espaço oferece hospedagem para grupos da terceira idade. A reserva deve ser feita na Casa de Convivência do Parque Tamandaré”, concluiu a nota enviada pela Sesa.
Números no país
Em 2018, o número de denúncias de violência contra idosos no Brasil aumentou 13% em relação ao ano anterior. O Disque 100, um serviço federal, recebeu mais de 37 mil denúncias neste período. Destas, 38% foram relativas a negligência, 26% de violência psicológica (como xingamentos, humilhação), 20% relativas a abusos financeiros e patrimoniais (ficar com a aposentadoria ou destruir bens do idoso, por exemplo) e 12% das denúncias foram de violência física.
Mais de 14 mil vítimas eram idosos que tinham algum tipo de deficiência, seja física, mental, visual, ou auditiva. Ainda segundo dados do serviço, os principais agressores foram os próprios filhos ou netos.
Fonte: Terceira Via
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