terça-feira, 1 de março de 2022

Carnaval de Campos: passado de glórias e futuro incerto

Carnavalescos, historiadores e governo municipal avaliam a situação das agremiações e da festa suspensa desde o início da pandemia

POR OCINEI TRINDADE
Desfile no Cepop Campos (Foto: Arquivo)

O carnaval em Campos dos Goytacazes já não é mais o mesmo há tempos. Desde que passou a acontecer fora do calendário oficial na gestão de Rosinha Garotinho (2009-2016), a festa popular na cidade enfrenta muitos altos e baixos. Por causa da pandemia de Covid-19 todos os desfiles de bois pintadinhos, blocos e escolas de samba foram suspensos. A Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima já informou às agremiações carnavalescas que precisa reformar o Cepop, e que não dispõe de dinheiro para promover a festa este ano. No passado, o carnaval de Campos viveu dias de glória e adesão de foliões de todos os tipos. Foi considerado o segundo mais importante do Rio de Janeiro, além da capital.
Desfile em Campos – Anos 1930

A historiadora e pesquisadora Graziela Escocard se diz encantada com acervos de fotos e recortes de jornais disponíveis no Museu Histórico de Campos dos Goytacazes, onde cenas de carnavais do passado foram registradas. Segundo ela, no século passado o carnaval de Campos ficou conhecido pela organização, desfiles e os bailes dos clubes. “No Museu Histórico, possuímos fotos diversas que evidenciam esse período áureo. A foto mais antiga é de 1925, que mostra a Avenida 15 de Novembro, próximo ao Clube Tenente Plutão, atual Teatro de Bolso”, destaca. Graziela Escocard recorre ainda a um texto publicado pelo jornalista Hervê Salgado Rodrigues.
Clube Plutão – Avenida 15 de Novembro – Início do século 20

“Ele dizia que em 1884 surgiu o Clube Tenentes do Plutão. Neste ano, o Carnaval foi especialmente espetacular, pois desfilaram com as comitivas carnavalescas da época: Índio Negro, Cacetes, Caras Duras, Tenentes do Diabo e Progressistas. Em 1900, o carnaval campista se afirma com acesa rivalidade entre o “Clube Tenentes do Plutão” e “Clube Macarroni”, com o “Indiano Goytacaz” como apaziguador. De acordo com o historiador Waldir Pinto de Carvalho era grande a animação dos bailes de gala no Carnaval para recepcionar o Rei Momo no Automóvel Clube, Saldanha, Itatiaia, Trianon, Associação dos Empregados do Comércio, Rio Branco e Lyra de Apollo”, cita Graziela.
Graziela Escocard

Memórias do carnaval

A professora e historiadora Sylvia Paes destaca um recorte de jornal do início do século 20, onde o carnaval em Campos é bastante elogiado.
Sylvia Paes e o neto em festa de carnaval (Acervo Pessoal)

“Meu avô saía no extinto clube Tenente de Plutões. Nessa época, grupos carnavalescos famosos possuíam sede. Até pouco tempo, na Avenida Alberto Torres, tinha a inscrição dos Plutões em um edifício. Creio que o carnaval de Campos ganhou destaque no Rio de Janeiro como o segundo mais importante, provavelmente por outras cidades não terem a festa organizada. Em Campos, havia os grupos e cordões de índios. Fizemos uma exposição nos anos 1990, com memória oral sobre carnaval. Um dos relatos dizia que esses grupos desfilavam com montaria a cavalo. Não havia corda de isolamento do público nas ruas. Os cavaleiros faziam essa guarda”, conta Sylvia.
Sylvia Paes menina fantasiada com os pais (Álbum de Família)

Sylvia Paes relata que até os anos 1960 os blocos do Saldanha da Gama, Automóvel Clube e Rio Branco, Caveira se encontravam no Boulevard, Centro de Campos. “Havia blocos de sujo, homens vestidos de mulher. Também havia o dia do corso, no domingo, com desfiles de carros pelas ruas da cidade. Nesta fase, o carnaval teve destaque como festa de rua. Depois veio a fase dos clubes e festas fechadas. Os clubes contratavam decoradores, bandas de fora, jantares, buffet especial. Em seguida, passou a se destacar o carnaval de rua nos bairros com os bois pintadinhos, e, por fim, os desfiles de blocos e escolas de samba na avenida”, resume.

Passado, presente e futuro

Com 61 sambas feitos para desfiles em avenida, Toninho Shita é compositor da escola Psicodélicos. Ele gosta de comentar os carnavais do passado, mas sem esquecer do presente e do futuro ainda incerto para várias agremiações de Campos.
Toninho Shita | oito sambas pelo Psicodélicos.

“Destaco o carnaval de 1991. O enredo “Aconteceu no Boulevard” relatava a história dos carnavais na cidade. Foi muito importante. Foi um lindo carnaval. Promoveu uma nova era para os Psicodélicos. Sou muito carnavalesco. Penso que deve haver coesão para voltar com os desfiles de carnaval. A festa dá muito emprego, move a economia. Vejo com preocupação algum movimento religioso contra o carnaval. É preciso tolerância. No futuro, é preciso pensar uma outra forma de realizar a festa”, diz
Markinho Sá

O ano de 2001 também foi importante para Toninho Shita e para o cantor e compositor Markinho Sá. Eles defenderam na Marquês de Sapucaí a escola de samba “Em Cima da Hora”, do Grupo de Acesso carioca. O samba-enredo “Goyatacá a mo pin – Campos das Delícias” sagrou-se vencedor. Atualmente, Markinho Sá diz se sentir pouco animado quando assunto é carnaval em Campos:

“Não tenho expectativa nenhuma. Tenho 36 anos de carnaval. Pertenço à Escola de Samba Boi Sapatão. Precisa tanta coisa, como a reforma do Cepop. A gente não sabe como as agremiações de Campos estão. A única certeza é que nos dias 6, 7 e 8 de abril vou cantar em Vitória, no carnaval fora de época”, conta Markinho. Em 1986, ele teve o primeiro samba vencedor no carnaval de Campos, pelo extinto bloco Barra Limpa de Goytacazes. “O enredo era de Adeilson Trindade. O samba “Criei, recriei e rebolei” foi composto em parceria com Beto do Turfe”, lembra.

Cepop e carnaval pós-pandemia


A presidente do Bloco de Samba Castelo do Parque Aurora, Geovana Almeida, também preside o Conselho Deliberativo da Liga das Escolas e Entidades Carnavalescas de Campos (Liesecam). Na última semana, houve uma reunião com todas as entidades blocos, bois e escolas de samba com a presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, Auxiliadora Freitas.
Geovana Almeida preside a Liesecam (Foto: Silvana Rust)

“A presidente nos mostrou a impossibilidade de o carnaval acontecer neste momento. O Centro de Eventos Populares Osório Peixoto (Cepop) teve toda a rede elétrica furtada, além da parte hidráulica comprometida e deteriorada. Ela nos apresentou um orçamento de R$500 mil para refazer a parte elétrica, hidráulica e pequenos reparos, além de R$3 milhões para acontecer eventos, mas que está em busca desse dinheiro. No momento, eles não teriam como arcar com essa responsabilidade. A FJCOL ficou de apresentar uma proposta de edital para que as agremiações comecem a se preparar para o carnaval do ano que vem. Fazer um carnaval sem o mínimo de estrutura financeira e sem o aporte do Município é inviável. Após o período de carnaval haverá uma reunião geral da Liga para saber qual caminho tomar ao longo do ano”, diz Geovana.
Auxiliadora Freitas

O projeto para revitalização do Cepop está em fase de finalização pelas secretarias responsáveis pelo planejamento, elaboração, quantificação de projetos de obras, segundo a presidente da FCJOL, Auxiliadora Freitas.

“A fundação vem promovendo manutenção e obras em seus equipamentos. Com o Cepop, não será diferente. No último dia 16, apresentamos projetos de fomento para a cultura popular, o que a municipalidade poderá oferecer, como o lançamento de editais de incentivo ao segmento do carnaval durante este ano. As condições sanitárias da pandemia serão de suma importância para que se decida alguma data no futuro”, explica Auxiliadora.
Desfile em Campos no Cepop (Arquivo)

A professora Sylvia Paes se diz apaixonada pelo carnaval. Ela espera a retomada da festa em Campos após o fim da pandemia.

“O momento mais importante é aqui e agora. Antes da pandemia, estava ressurgindo o carnaval de rua. As comunidades do Morrinho, Mocidade Louca e Psicodélicos festejam nos bairros. Todo mundo brinca: criança, adulto velho. Eu me sinto otimista com a volta do carnaval. Estou doida para que passe a pandemia e retomem os carnavais. Que a gente volte a cantar e a dançar”, conclui.

Galeria de fotos antigas do carnaval em Campos















Galeria de fotos de carnavais recente no Cepop de Campos






Fonte:Terceira Via


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