segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Pela primeira vez, ensino à distância cresce mais que o presencial no país

Modelo acolhe pela flexibilidade de horários, mas preocupa especialistas quanto à qualidade do ensino e da aprendizagem

Aluno | Romeu Coelho Nascimento optou pelo modelo semipresencial

A pandemia do novo coronavírus impôs a muitos setores da sociedade uma readaptação e a necessidade de isolamento social trouxe consigo novas alternativas. O modelo de Educação à Distância (EAD) já existia, mas ganhou força nesse período. Dados do Censo da Educação Superior 2020, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), apontam que o número de ingressantes na graduação por este modelo ultrapassou, pela primeira vez, o ensino presencial. No mesmo período, os números do modelo presencial tiveram 14% de recuo. Profissionais da Educação ouvidos pelo Jornal Terceira Via apontam que o modelo veio para ficar, mas que vai exigir monitoramento do Ministério da Educação (MEC) e dos órgãos reguladores para cumprir seu papel educacional.

Reitor do Instituto Federal Fluminense (IFF), instituição com 12 campi espalhados pelo Norte, Noroeste, Lagos e parte da região Metropolitana do Rio de Janeiro, Jefferson Azevedo alerta para a disparidade na oferta de vagas entre o modelo presencial e à distância.

“Nós temos um aumento das vagas na Educação Superior, mas, se olharmos bem, a motivação é a massiva oferta de vagas e de cursos superiores privados à distância. O presencial caiu muito no setor privado. Acredito que houve uma pequena queda na oferta presencial das universidades federais, muito mais pela questão da pandemia. Também nos nossos institutos (IFFs), percebemos uma alteração, mas já estamos voltando aos níveis pré-pandemia. Mas nos preocupa essa ampliação do número de vagas, especialmente no EAD”, pontua o reitor.
Coordenador | Victor Martin

O professor Victor Martin Flores, coordenador do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas EAD da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), que faz parte do consórcio do Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro (Cederj), também aponta para a disparidade na oferta de vagas entre os dois modelos.

“Pela análise dos dados do Inep, quem cresceu assustadoramente mais em termos de EAD foram as instituições particulares. Elas ofereceram uma quantidade brutal de novas entradas para o sistema EAD. No sistema público também cresceu, por isso, a média de mais de 400% em crescimento do EAD, no período de 2019 a 2021, é enorme. Quem tornou isso possível nos últimos anos foi o sistema particular”, expõe.

Jefferson diz acreditar no sistema à distância, mas pontua que a qualidade dos cursos privados por vezes é questionável e, com valores acessíveis, acaba atraindo pessoas que sonham com uma graduação, mas não têm tempo para faculdade em tempo integral. “Os cursos à distância vieram para ficar e vão ser aprimorados. Mas eles são muito mais suscetíveis a uma oferta onde o interesse financeiro daquela instituição que está ofertando pode suplantar a qualidade do ensino. É preciso que as pessoas estejam muito atentas. Isso aumenta a responsabilidade do Ministério da Educação e dos órgãos de regulação, que devem ser muito criteriosos na hora de autorizar as instituições na oferta desses cursos”, pontua.
Alunos de modo semi-presencial

Implantação e avaliação

O professor Victor Martin explica que o EAD já é uma realidade na Uenf, assim como em todo o consórcio Cederj, mas, especificamente no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, o sistema é semipresencial, por razões específicas.

“Muitas das disciplinas de cunho biológico precisam da prática e a prática pode ser simulada, mas não chega a impactar ou didaticamente aprofundar o conhecimento que o aluno tem que ter de alguns conceitos. Isso para falar de licenciatura. No bacharelado é ainda pior, ou seja, precisam de prática de como desenvolver isolamento de proteínas em laboratório, de como analisar bactérias em laboratório, como isolar bactérias, como manipular DNA em laboratório, entre outras”, explica.

Para o professor, é possível complementar a educação com disciplinas ou conteúdo EAD, mas uma adequação integral ao modelo seria inviável pela didática complexa e cheia de nuances do sistema EAD e pela fragilidade nos métodos de avaliação.

“É sabido por nós, por conclusões em congressos internacionais sediados no Brasil, que não há nenhuma metodologia, programa ou sistema de avaliação online que garanta que o aluno não consiga colar. Isso é muito importante na adoção do sistema EAD, em um curso de qualidade, onde o aluno realmente estuda”, pontua.

Acesso à Educação

O macaense Romeu Coelho Nascimento é aluno do curso de Licenciatura Ciências Biológicas EAD (semipresencial), na Uenf. Ele tentou a modalidade presencial na universidade, em Campos, mas, como jovem de periferia, sempre teve necessidade de trabalhar e não conseguiria conciliar a faculdade em tempo integral.

“Mesmo que existam bolsas e possibilidade de trabalho até mesmo dentro da universidade, não supre a nossa necessidade. Esse é o modelo da própria educação do futuro. Salas com carteiras enfileiradas são coisa do passado”, diz o aluno.

Romeu é presidente fundador da primeira empresa júnior semipresencial do Brasil. “Dentro do Cederj nós também somos a primeira empresa Júnior”, conta ele, que fundou em 2021 a Ecolagos Educação Ambiental Júnior.
AsCom

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