Vinicius Lima é doutor em Geografia pela UFF, além de professor de pós-doutorado da Uenf: "é preciso esforço mútuo para recuperação"
Por Ocinei TrindadeLimpeza do canal Campos-Macaé, na área urbana campista (Fotos: Silvana Rust)
o J3News destaca esta semana a reportagem “Inércia do Estado atrapalha obras no Canal Campos-Macaé” (Leia Aqui). O prefeito Wladimir Garotinho chegou a afirmar que o projeto “Limpa Rio” do Governo Estadual acontece de forma “equivocada e descoordenada”, com risco de parte da Avenida José Alves de Azevedo ceder e haver desabamento para dentro do canal. O pesquisador Vinicius Lima considera ser necessário um esforço mútuo entre universidades, Poder Público e sociedade civil para recuperar o Canal Campos-Macaé. Ele é doutor em Geografia pela Universidade Federal Fluminense, além de pesquisador de pós-doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais da Universidade Estadual do Norte Fluminense.
Apesar de inutilizado ou mal aproveitado em Campos, o Canal Campos-Macaé necessita de manutenção e limpeza. Recentemente, um afundamento de solo foi flagrado próximo à Avenida José Alves de Azevedo. Como o senhor analisa a manutenção e a situação atual do canal na zona urbana da cidade?
O Canal Campos-Macaé (ou Macaé-Campos) é um dos mais importantes cursos hídricos que perpassam pelo município de Campos dos Goytacazes, tendo sua adução no Rio Paraíba do Sul e foz no Rio Macaé. É um erro pensar que ele não cumpre funções ambientais, encarando-o como destino do esgoto. A despeito do uso do canal em Campos, qual seja, despejo de efluentes, devida atenção deve ser dada a sua gestão e manutenção, uma vez que famílias dele dependem ao longo do seu curso.
O problema da manutenção, bem como da gestão do canal Campos-Macaé, associa-se à ausência (ou quase isso) de verbas destinadas a este fim. Recentemente, cedi uma entrevista para o J3News na qual expus a interconectividade entre as entidades hidrogeomorfológicas, não apenas de Campos, mas da região Norte Fluminense. Com o canal Campos-Macaé não é diferente. Ele conecta canais, rios e lagoas ao longo dos seus aproximados 100km de extensão.
O canal encontra-se muito degradado no perímetro urbano da cidade de Campos. Muito embora um rio/canal possa se “recuperar” ao longo do seu curso, ações de combate à poluição e degradação ambiental no âmbito da escala do município são necessárias para quem deseja a boa qualidade das águas e os benefícios a ela associados.
o J3News destaca esta semana a reportagem “Inércia do Estado atrapalha obras no Canal Campos-Macaé” (Leia Aqui). O prefeito Wladimir Garotinho chegou a afirmar que o projeto “Limpa Rio” do Governo Estadual acontece de forma “equivocada e descoordenada”, com risco de parte da Avenida José Alves de Azevedo ceder e haver desabamento para dentro do canal. O pesquisador Vinicius Lima considera ser necessário um esforço mútuo entre universidades, Poder Público e sociedade civil para recuperar o Canal Campos-Macaé. Ele é doutor em Geografia pela Universidade Federal Fluminense, além de pesquisador de pós-doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais da Universidade Estadual do Norte Fluminense.
Apesar de inutilizado ou mal aproveitado em Campos, o Canal Campos-Macaé necessita de manutenção e limpeza. Recentemente, um afundamento de solo foi flagrado próximo à Avenida José Alves de Azevedo. Como o senhor analisa a manutenção e a situação atual do canal na zona urbana da cidade?
O Canal Campos-Macaé (ou Macaé-Campos) é um dos mais importantes cursos hídricos que perpassam pelo município de Campos dos Goytacazes, tendo sua adução no Rio Paraíba do Sul e foz no Rio Macaé. É um erro pensar que ele não cumpre funções ambientais, encarando-o como destino do esgoto. A despeito do uso do canal em Campos, qual seja, despejo de efluentes, devida atenção deve ser dada a sua gestão e manutenção, uma vez que famílias dele dependem ao longo do seu curso.
O problema da manutenção, bem como da gestão do canal Campos-Macaé, associa-se à ausência (ou quase isso) de verbas destinadas a este fim. Recentemente, cedi uma entrevista para o J3News na qual expus a interconectividade entre as entidades hidrogeomorfológicas, não apenas de Campos, mas da região Norte Fluminense. Com o canal Campos-Macaé não é diferente. Ele conecta canais, rios e lagoas ao longo dos seus aproximados 100km de extensão.
O canal encontra-se muito degradado no perímetro urbano da cidade de Campos. Muito embora um rio/canal possa se “recuperar” ao longo do seu curso, ações de combate à poluição e degradação ambiental no âmbito da escala do município são necessárias para quem deseja a boa qualidade das águas e os benefícios a ela associados.
Vinicius Lima é geógrafo e pesquisador de pós-doutorado
do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais da Uenf (Divulgação)
Há décadas, o canal virou Beira-Valão, devido ao esgoto e galerias pluviais serem despejados no local. Como observa a questão da poluição e abandono?
Na Geografia e na Ecologia, diz-se que os ecossistemas possuem forma e função em relações indissociáveis. Do ponto de vista da forma, o canal Campos-Macaé não sofreu grandes alterações ao longo da sua história. Não podemos dizer o mesmo quanto à função. Inicialmente construído com o fim de escoamento de mercadorias e navegação, ele logo ficou obsoleto com a chegada da ferrovia, que possibilitava maior celeridade, reduzindo o tempo entre os lugares. Bom, até o governo Collor o canal era gerido pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento. Com a extinção do DNOS, a responsabilidade passou para o órgão ambiental estadual. Existe aí um problema, uma vez que estas instituições não possuem verba e nem mesmo pessoal para lidar, não apenas com o canal Campos-Macaé, mas para toda a rede de mais de 1.200 km de canais artificiais construídos na Baixada dos Goytacá (Baixada Campista).
Essa realidade faz com que o canal sofra distintas intervenções antrópicas por parte dos pecuaristas, dos quais o canal perpassa pela propriedade. Mas o principal problema se dá na relação Homem/Meio Ambiente na cidade de Campos, onde a falta de medidas estruturantes, a exemplo da educação ambiental para sensibilização da população, mantém uma conjuntura na qual os governantes não se sentem pressionados a lidar com o verdadeiro problema, qual seja, a função que o canal cumpre hoje: destino de efluentes de toda natureza.
Há trechos do Canal Campos-Macaé em melhor estado, como em Quissamã, onde há locais navegáveis. Há trechos completamente secos em Campos. Por que isso ocorre?
Para responder essa pergunta, é necessário que coloquemos o debate no escopo da Geomorfologia Fluvial. A despeito do canal Campos-Macaé ser uma entidade artificial, ele é antes um rio. Um rio artificial, mas um rio. Todo rio possui a sua bacia de drenagem. Uma bacia de drenagem pode conter um ou mais rios. No caso da bacia do canal Campos-Macaé, ao longo deste curso hídrico, ele é abastecido com as águas do Canal Cacomanga, do Rio Ururaí, Lagoa Feia, Rio Macabu e demais lagoas do Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba (PARNA-Jurubatiba).
As águas do Rio Ururaí fluem, principalmente, de duas outras bacias de drenagem, quais sejam: bacia do Imbé e bacia do Rio Urubu. Essas águas são cristalinas, visto que suas nascentes se encontram na Serra do Mar. Fato que também podemos dizer do Rio Macabu. O mesmo raciocínio deve ser feito para as lagoas de Jurubatiba, uma vez que se trata de uma unidade de conservação e proteção integral. É pela combinação desses fatores que o canal Campos-Macaé se torna navegável em alguns trechos, até chegar em Macaé, onde novamente apresenta estado de degradação.
do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais da Uenf (Divulgação)
Há décadas, o canal virou Beira-Valão, devido ao esgoto e galerias pluviais serem despejados no local. Como observa a questão da poluição e abandono?
Na Geografia e na Ecologia, diz-se que os ecossistemas possuem forma e função em relações indissociáveis. Do ponto de vista da forma, o canal Campos-Macaé não sofreu grandes alterações ao longo da sua história. Não podemos dizer o mesmo quanto à função. Inicialmente construído com o fim de escoamento de mercadorias e navegação, ele logo ficou obsoleto com a chegada da ferrovia, que possibilitava maior celeridade, reduzindo o tempo entre os lugares. Bom, até o governo Collor o canal era gerido pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento. Com a extinção do DNOS, a responsabilidade passou para o órgão ambiental estadual. Existe aí um problema, uma vez que estas instituições não possuem verba e nem mesmo pessoal para lidar, não apenas com o canal Campos-Macaé, mas para toda a rede de mais de 1.200 km de canais artificiais construídos na Baixada dos Goytacá (Baixada Campista).
Essa realidade faz com que o canal sofra distintas intervenções antrópicas por parte dos pecuaristas, dos quais o canal perpassa pela propriedade. Mas o principal problema se dá na relação Homem/Meio Ambiente na cidade de Campos, onde a falta de medidas estruturantes, a exemplo da educação ambiental para sensibilização da população, mantém uma conjuntura na qual os governantes não se sentem pressionados a lidar com o verdadeiro problema, qual seja, a função que o canal cumpre hoje: destino de efluentes de toda natureza.
Há trechos do Canal Campos-Macaé em melhor estado, como em Quissamã, onde há locais navegáveis. Há trechos completamente secos em Campos. Por que isso ocorre?
Para responder essa pergunta, é necessário que coloquemos o debate no escopo da Geomorfologia Fluvial. A despeito do canal Campos-Macaé ser uma entidade artificial, ele é antes um rio. Um rio artificial, mas um rio. Todo rio possui a sua bacia de drenagem. Uma bacia de drenagem pode conter um ou mais rios. No caso da bacia do canal Campos-Macaé, ao longo deste curso hídrico, ele é abastecido com as águas do Canal Cacomanga, do Rio Ururaí, Lagoa Feia, Rio Macabu e demais lagoas do Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba (PARNA-Jurubatiba).
As águas do Rio Ururaí fluem, principalmente, de duas outras bacias de drenagem, quais sejam: bacia do Imbé e bacia do Rio Urubu. Essas águas são cristalinas, visto que suas nascentes se encontram na Serra do Mar. Fato que também podemos dizer do Rio Macabu. O mesmo raciocínio deve ser feito para as lagoas de Jurubatiba, uma vez que se trata de uma unidade de conservação e proteção integral. É pela combinação desses fatores que o canal Campos-Macaé se torna navegável em alguns trechos, até chegar em Macaé, onde novamente apresenta estado de degradação.
Sujeira no canal e local próximo a afundamento na Avenida José Alves de Azevedo
Como geógrafo, comente as condições de preservação desse patrimônio histórico.
Enquanto geógrafo, penso que para lidar com o canal Campos-Macaé é necessário um esforço mútuo entre Universidades, Poder Público e Sociedade Civil. Não consigo imaginar o planejamento e o ordenamento territorial-ambiental alheio a este diálogo. São necessárias ações de saneamento e tratamento total de efluentes, além de medidas estruturais, como a limpeza e dragagem regular do canal. Além disso, são necessárias medidas estruturantes com o fim de informar e sensibilizar a população sobre os serviços ecossistêmicos que o canal proporciona.
Em geral, os carnais artificiais de Campos sofrem dos mesmos problemas que Campos-Macaé? Qual o futuro deles se não houver limpeza e manutenção? Qual a importância dos canais para a região em 2024?
Sim, você está correto. Os problemas do canal Campos-Macaé não são diferentes dos problemas do canal Coqueiros, por exemplo. Há, contudo, outros canais que não drenam grandes áreas urbanas, como o canal São Bento e o canal Quitingute, ou mesmo o canal Cataia e o canal Eng. Antônio Resende. Esses canais se encontram em melhores estados de conservação em detrimento do canal Campos-Macaé. Isso não significa, entretanto, que eles também não necessitem de obras de macrodrenagem. Afinal de contas, eles foram construídos para aumentar o potencial de drenagem da Baixada Campista, mitigando os efeitos das grandes inundações e ampliando áreas para o uso agropecuário.
Como geógrafo, comente as condições de preservação desse patrimônio histórico.
Enquanto geógrafo, penso que para lidar com o canal Campos-Macaé é necessário um esforço mútuo entre Universidades, Poder Público e Sociedade Civil. Não consigo imaginar o planejamento e o ordenamento territorial-ambiental alheio a este diálogo. São necessárias ações de saneamento e tratamento total de efluentes, além de medidas estruturais, como a limpeza e dragagem regular do canal. Além disso, são necessárias medidas estruturantes com o fim de informar e sensibilizar a população sobre os serviços ecossistêmicos que o canal proporciona.
Em geral, os carnais artificiais de Campos sofrem dos mesmos problemas que Campos-Macaé? Qual o futuro deles se não houver limpeza e manutenção? Qual a importância dos canais para a região em 2024?
Sim, você está correto. Os problemas do canal Campos-Macaé não são diferentes dos problemas do canal Coqueiros, por exemplo. Há, contudo, outros canais que não drenam grandes áreas urbanas, como o canal São Bento e o canal Quitingute, ou mesmo o canal Cataia e o canal Eng. Antônio Resende. Esses canais se encontram em melhores estados de conservação em detrimento do canal Campos-Macaé. Isso não significa, entretanto, que eles também não necessitem de obras de macrodrenagem. Afinal de contas, eles foram construídos para aumentar o potencial de drenagem da Baixada Campista, mitigando os efeitos das grandes inundações e ampliando áreas para o uso agropecuário.
Trecho urbano do Canal Campos-Macaé
Durante o meu doutorado, realizei uma entrevista junto ao INEA e pude concluir que não há verba para que obras de macrodrenagem sejam realizadas em Campos. A última grande obra do INEA foi em 2011, no “PAC de recuperação do sistema de drenagem da Baixada Campista”. Desde então nada muito grande foi realizado. Caso os canais da nossa região sigam sem a adequada manutenção periódica e, frente às mudanças climáticas em curso, podemos esperar cenários extremos como a ocorrência de inundações excepcionais com maior frequência.
Além disso, podemos esperar conflitos no campo entre pecuaristas e pescadores e assentados. E esses são apenas alguns dos problemas decorrentes caso não haja manutenção periódica do sistema de canais artificiais da Baixada dos Goytacá ou Baixada Campista.
Durante o meu doutorado, realizei uma entrevista junto ao INEA e pude concluir que não há verba para que obras de macrodrenagem sejam realizadas em Campos. A última grande obra do INEA foi em 2011, no “PAC de recuperação do sistema de drenagem da Baixada Campista”. Desde então nada muito grande foi realizado. Caso os canais da nossa região sigam sem a adequada manutenção periódica e, frente às mudanças climáticas em curso, podemos esperar cenários extremos como a ocorrência de inundações excepcionais com maior frequência.
Além disso, podemos esperar conflitos no campo entre pecuaristas e pescadores e assentados. E esses são apenas alguns dos problemas decorrentes caso não haja manutenção periódica do sistema de canais artificiais da Baixada dos Goytacá ou Baixada Campista.
Fonte: J3News
Nenhum comentário:
Postar um comentário