Centro novo esbarra em legislação antiga

Comércio pede mudança no Código de Obras e no Plano Diretor

POR DANIELA ABREU


Engavetada há pelo menos seis anos, a revitalização do Centro Histórico de Campos voltou às discussões na última semana, depois que o prefeito Wladimir Garotinho autorizou estudos internos para a implementação de um novo projeto. Entidades do setor produtivo, como Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Associação Comercial e Industrial de Campos (Acic) e Associação dos Comerciantes e Amigos da Rua João Pessoa e Adjacências (Carjopa) apresentaram uma lista de reivindicações que passam, principalmente, por mudanças no Plano Diretor e no Código de Obras, além de reclassificação que especifique, junto ao Conselho do Patrimônio Histórico e Cultural de Campos (Coppam), o que é considerado histórico ou simplesmente antigo. Segundo essas entidades, a legislação atual traz exigências que tornam o Centro de Campos ‘inviável’ para quem quer investir em comércio ou habitação. Para CDL, Acic e Carjopa, qualquer tentativa de revitalizar o Centro passa, necessariamente, por essas questões. A revitalização, que foi iniciada no governo Rosinha Garotinho, ficou parada durante os quatro anos da gestão passada e nos dois primeiros anos da administração atual.

O presidente da CDL, Edvar Chagas Júnior, apontou problemas que, segundo ele, precisam ser resolvidos para o que chama de repovoamento da área central.


“Hoje o gabarito do Centro [regra que limita a altura das construções], se não me engano, vai até 13 metros. Podemos dobrar esse gabarito para 26 metros, que vão dar de cinco a seis andares para um imóvel. Isso é interessante para o investidor imobiliário poder construir na área central, o que já ocorre no Centro do Rio de Janeiro. A não exigência de vagas de garagem também é interessante. Nós precisamos tornar o Centro mais atrativo, da mesma forma que a Pelinca e que Goitacazes e a Nazário Pereira Gomes, em Guarus, são interessantes. Esses locais têm vida o dia inteiro porque existem moradores. Precisamos de uma permissão específica para o Centro de Campos, no Código de Obras, para que incentive os moradores”, disse.

Fernando Loureiro, presidente da Acic, também apontou a necessidade de mudanças no Plano Diretor e no Código de Obras, além de outras a serem implantadas, que dependem da Prefeitura e da Câmara.

“É preciso dar habitabilidade ao Centro, isentando toda a área, em um raio de cerca de 1km a 1,5km, ao redor da necessidade de garagem. Em toda essa área, quem quiser construir não vai precisar de garagem. Atualmente, dependendo do terreno, para construir, tem que colocar vagas. Com quatro vagas na frente do estabelecimento, se colocar dois ou quatro carros, quem passa na rua não vê o comércio. Se for antigo então, piorou, porque cai em um processo no Coppam”, aponta.

Tanto Loureiro quanto Edvar apontam, ainda, a necessidade de padronização das calçadas de algumas ruas, como foi feito na Carlos Lacerda, João Pessoa, Andradas e outras; a reestruturação do transporte público, com repressão ao transporte clandestino, que ainda acontece no Centro; o incentivo ao uso de bicicletas, complementando a malha de ciclovias e ciclofaixas; recuperação do chafariz da Praça São Salvador; a manutenção da estética com a remoção das fiações, conforme previsto no primeiro projeto, dentre outras medidas.


Carjopa
A Carjopa também apresentou sugestões. Há um projeto em estudo que prevê a sublocação de lojas fechadas e criação de boxes internos. A ideia, que já foi aprovada pelos pares de outras entidades e ainda está sendo avaliada, inicialmente prevê que a Prefeitura alugue os imóveis, após análise completa do mesmo e subloque a permissionários.

A medida reorganizaria o comércio ambulante na área central e abriria mais vagas e possibilidades para pequenos comerciantes. A primeira sugestão de implantação seria no início da Rua Sete de Setembro, no Centro, onde há uma série de imóveis comerciais fechados.

O antigo e o histórico
As entidades apontam, ainda, que alguns entraves, com relação à classificação de imóveis antigos e históricos, no Centro de Campos, tem interferido em novos negócios e na manutenção desses prédios pelas famílias.


“Existe uma grande confusão entre o que é histórico e o que é velho e, às vezes, a pessoa herda um prédio antigo, sem características históricas e é obrigado a mantê-lo daquela forma. O que vale, manter o patrimônio histórico inabitado ou dar função a ele?”, questionou Loureiro.

A sugestão dos representantes da Acic e da CDL, assim como ocorre no Rio de Janeiro e outras cidades, é que se possa manter as fachadas, flexibilizando completamente a parte interna para intervenções. A ideia é semelhante ao conceito de Retrofit, técnica arquitetônica reivindicada pelo comércio para ser implantada na área central. O estudo já foi autorizado pelo prefeito.

Em nota, a presidente do Coppam, Auxiliadora Freitas, lamentou a falta de entendimento e disse que os casos são analisados individualmente. “É lamentável que o desperdício do encanto oferecido pelo visual da arquitetura eclética inserida na área central não sensibilize os proprietários dos imóveis como deveria. Por que desfigurar ou demolir o que já existe? Se levar ao chão hoje um prédio e em seguida construir um outro, daqui a algum tempo ele já será também velho. Não há como fugir do tempo. Qualquer intervenção em imóveis tombados ou inseridos na Área Especial de Interesse Cultural deverá ter um projeto detalhando o que se pretende fazer. O Conselho analisa e emite um parecer sobre o projeto. Quanto à flexibilidade em caso de reformas, ela sempre esteve presente nas decisões do Coppam. Cada caso é um caso.”


O arquiteto, membro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) e ex-conselheiro do Coppam, Humberto Neto das Chagas, reafirmou que qualquer mudança vai passar pela vontade política de alterar algumas regras. “Essas iniciativas têm que partir primeiro, e muito, do poder público. Uma das opções para o Centro da cidade é o fomento e a implantação de construções residenciais. Tudo vai da intenção do governo [Executivo e Legislativo], se ele quiser, vai flexibilizar a garagem, o gabarito e todo o resto. Além disso, o Coppam carece de um corpo técnico. Tem pessoas que são interessadas e bem-intencionadas, mas é necessário um corpo técnico para apontar soluções às demandas, porque nós precisamos avançar nesse assunto”, disse o arquiteto.

Prefeitura e Câmara
A Secretaria de Planejamento, Mobilidade e Meio Ambiente informou, em nota, “que estão sendo orçadas as obras de revitalização de três praças do Centro: Praça Elias Vieira de Vasconcelos (ao lado do Campos Shopping), Tiradentes (em frente ao Hotel Flávio) e a praça ao lado da Catedral (onde será um espaço para a Terceira Idade). Para dar continuidade ao projeto, a pasta tem realizado reuniões para alinhar as solicitações do empresariado – CDL e Carjopa – e desenvolver iniciativas para dinamizar o Centro e o comércio da região”.

O presidente da Câmara de Vereadores, Marquinho Bacellar, disse que a reunião ocorrida na última semana com representantes de entidades de classe é o início de uma proximidade que tem que existir. Em nota, ele informou, ainda, que “a Câmara vai seguir ouvindo o setor produtivo e, como foi acordado em reunião, todas as demandas serão discutidas internamente no Legislativo e também com o governo municipal. Seguiremos dando todos os passos de forma transparente e em sintonia com todas as partes envolvidas”.

Retrofit
O próprio estudo de Retrofit, autorizado pelo prefeito, vai passar pela necessidade de mudanças na legislação para ser implantado. A técnica é uma tendência mundial para recuperar prédios antigos, surgida na Europa e implantada em muitos países, inclusive o Brasil. Nela, construções antigas são preservadas, com adequação da legislação, mas permitindo toques de inovação enquanto preserva o estilo original.

Fonte:J3News