domingo, 27 de novembro de 2016

Erros jurídicos reduzem pena de condenado por tráfico em 10 anos


Erros jurídicos permitiram que Fábio Pinto dos Santos, o Fabinho São João, deixasse para trás o cumprimento de dez anos de pena. Considerado o chefão do Comando Vermelho (CV) em 2009, principal facção criminosa do Rio, ele saiu pela porta da frente da Penitenciária Federal de Mossoró, em 16 de setembro. Mas pelos cálculos de duas procuradoras do Ministério Público do Rio, Fabinho São João só poderia ter considerada a sua pena extinta em 2026 e não agora como decidiu o juiz federal corregedor substituto da penitenciária.

Pena de Fabinho era de 42 anos e sete meses por latrocínio e tráfico

Como o Ministério Público Federal não recorreu da sentença, o caso é considerado encerrado. Mas caiu como uma bomba no estado. A maior preocupação do Ministério Público Estadual é a de que novos equívocos na concessão de benefícios ocorram com os outros 108 presos de alta periculosidade que estão em quatro unidades federais. “Não é caça às bruxas. Identificamos os erros ao avaliar a decisão. Quando o preso é transferido do Rio, é a Justiça Federal que fica responsável, mas acho que a avaliação de concessão de benefícios deveria ser feita pelo juiz de onde originou o processo”, explicou a procuradora Celma Alves.

A pena original de Fabinho São João era de 42 anos e sete meses pelos crimes de latrocínio (roubo seguido de morte), em 1989, e duas vezes por associação para o tráfico de drogas, em 2002 e 2010. Quatro de oito comutações (reduções da pena) são contestadas pela procuradora Rita de Cássia Araújo de Faria, que representa o MP estadual no Conselho Penitenciário do Rio. Ela aponta que a condenação de Fabinho São João a sete anos de prisão pelo crime de associação ao tráfico de drogas, em 2010, impedia qualquer diminuição no total da pena de acordo com os decretos presidenciais 7.420/2011; 7.873/2012 e 8.172/2013.

A procuradora sustenta ainda que ele não poderia ganhar também redução de pena em 2010 porque neste ano, mesmo preso, praticou o crime de associação ao tráfico, considerado falta grave, que proíbe a comutação. “Constatei os equívocos das comutações das penas porque pesquisei o processo. São erros jurídicos e não de cálculos de pena. Mas não há nada que o Ministério Público do Rio possa fazer”, justificou a procuradora Rita de Cássia.

O processo de Fabinho São João foi parar na Justiça de Santa Catarina e ainda não chegou a Vara de Execuções Penais (VEP) do Rio. Segundo o Ministério Público Federal houve um erro no endereçamento nos Correios, mas que seria sanado, para que os documentos chegassem à Justiça carioca, o local correto.

A reportagem procurou o juiz Orlan Donato Rocha, através da assessoria de imprensa da Justiça Federal do Rio Grande do Norte, que encaminhou a decisão do magistrado, mas não respondeu aos questionamentos. A VEP do Rio informou que não se pronunciaria sobre o caso. A vara só atua em processos de presos que estão no estado.

FALHA
Dois servidores e dois magistrados participaram do trabalho de aferir os benefícios concedidos a Fabinho São João. É o que assegurou o juiz corregedor da penitenciária federal de Mossoró, Walter Nunes. “Foi feita uma análise jurídica sobre a concessão dos benefícios. Agora, o juiz pode errar? Qualquer um pode. Agora, a gente tem a maior cautela na área criminal em função das suas consequências. Esse caso também passou por mim”, afirmou Walter Nunes.

O magistrado fez questão de ressaltar ainda que quando o Ministério Público Federal não concorda com a decisão entra com recurso cabível, o que não ocorreu. “Hoje tecnicamente não há o que fazer. Houve trânsito em julgado (decisão que não cabe mais recurso)”, esclareceu. Walter Nunes não quis entrar no mérito da decisão de Orlan Donato Rocha, mas defendeu a lisura do trabalho.

Rita de Cássia constatou os equívocos das comutações do processo

“Os cálculos foram feitos e refeitos mais de uma vez para que a sentença fosse proferida. Agora, é possível um erro? Quando ocorre há questionamentos do Ministério Público Federal, mas não vou responder perguntas específicas sobre a decisão. Procure o juiz Orlan”, declarou Nunes.

Nesse caso, o Ministério Público Federal só entrou com um embargo de declaração, recurso que só pede esclarecimentos sobre o texto da decisão. Logo após a entrevista com Walter Nunes, a reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa da Justiça Federal para ouvir o juiz Orlan, mas não obteve resposta.

DIVERGÊNCIA
O procurador da República Gilberto Barroso, que atuou no caso de Fábio Pinto dos Santos, o Fabinho São João, argumentou que o juiz Orlan Donato Rocha elaborou novo cálculo da pena que divergia com o feito pela Vara de Execuções Penais do Rio. “O que levou MPF a interpor recurso de embargos de declaração (aquele que tira dúvidas sobre a sentença) com a finalidade de permitir a exposição do motivo do ato. O juízo não conheceu (aceitou), decidindo que o cálculo da pena atualizado não era decisão desafiadora de recurso, por se tratar de ato de mero expediente. O que impossibilitou o escorreito (correto) exame do MPF”, afirmou Gilberto Barroso.

O procurador alegou ainda que já havia opinado pela devolução do preso ao Rio. Assim, a VEP do Rio passaria a ser a responsável para avaliar o preenchimento das condições relacionadas à concessão de progressão de regime ou até mesmo a extinção da pena. “Entretanto, o juízo federal, com base no novo cálculo, reconheceu o cumprimento integral da pena e determinou que Fabinho São João fosse solto.

Gilberto Barroso frisou que aprimorar a prestação jurisdicional (trabalho feito pela Justiça e o Ministério Público Federal) é uma busca. “Inclusive, pelo Juízo Corregedor, não estando este último imune a eventual equívoco”, analisou o procurador da República.

Foi visitar a família e não voltou

Pelos cálculos do Ministério Público do Estado, Fabinho São João tinha três condenações, uma por latrocínio (roubo seguido de morte) e duas por associação ao tráfico. Em agosto, a Vara de Execuções Penais do Rio aceitou o pedido de renovação da permanência dele no Presídio Federal de Mossoró feito pelo então secretário de Segurança, José Mariano Beltrame.

Gilberto Barroso atuou no caso de Fabinho São João e refez os cálculos

Fabinho São João responde por tráfico de drogas, com audiência marcada para o dia 1º de dezembro na 11ª Vara Criminal, e homicídio, que será julgado em fevereiro no 4º Tribunal do Júri. Em 2008, ganhou o direito de visitar a família e não voltou para presídio em Niterói. Foi preso em 2009 e, por ser considerado preso de alta periculosidade, foi transferido para unidade federal.

Penitenciárias em 4 estados
O governo federal é responsável por quatro penitenciárias nos estados do Paraná, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte e Rondônia. Todas têm capacidade para 208 presos. Para impedir a ação dos considerados perigosos, o Rio com frequência pede à Justiça a transferência de presos, embora eles continuem dando ordens das cadeias.

Nomes conhecidos da violência carioca como Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, está em Porto Velho, Rondônia; Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, Marcio Santos Nepomuceno, Marcinho VP, Adair Marlon Duarte, Adair da Mangueira e Edson Silva de Souza, o Orelha, estão na Penitenciária Federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte.

As unidades são comandadas pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça. O órgão informou que não comenta decisão judicial e que apenas cumpre.
O Dia/Show Francisco

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